A Segurança Interna: o índice desconhecido da cinematografia do futuro
- danielsa510

- 31 de mai. de 2021
- 3 min de leitura
Atualizado: 9 de jul. de 2021

Direção: Christian Petzold. Roteiro: Harun Farocki, Christian Petzold. Montagem: Bettina Böhler. Direção de Fotografia: Hans Fromm. Direção de Arte: Fernando Areal. Música: Stefan Will. Design de Produção: Klaus-Dieter Gruber. Som: Bettina Blickwede.
Esse índice desconhecido e oculto é sem dúvidas uma das formas de expressão mais potentes da filmografia de um autor como Christian Petzold. A condição dessa informação que não se completa é mais que um artifício de engajamento e compromisso a ser costurado entre a obra apresentada e o espectador diante dela.
E mesmo que pensemos ao fim do trajeto dramatúrgico termos nossa resposta final, a nós, caberá somente a intuição daquilo o que pensamos sentir e entender a cada terço traçado pelo filme. Antes, essa pode ser lida, entre uma gama de outras interpretações, como uma experiência da ordem da consciência no exercício fílmico.
Da parte do realizador no seu lugar de autoria, cabe muito um senso de entender os papéis dos personagens por ele criados, bem como da posição de total controle dos eventos que a estória elucida e de onde ela própria ganha forma. Longe de vermos isso como um status de autoritarismo, antes se faz um gesto prático de clareza.
Entendimento de que há incontáveis e infindáveis vias para a apresentação e desenvolvimento daquilo o que entendemos por narrativa fílmica. Afinal, como é que um filme pode falar de geopolítica, por exemplo, sem parecer muito hermético muito menos cartesiano e simplista? Não subestimar a audiência é uma boa parte da validação dessa prerrogativa.
Esse cinema do futuro, e sobretudo, aquele que nasce ali na transição "entre milênios" parece muito solidamente entender tudo isso. E aqui, Petzold abre mão de um coeficiente estético, como a estilização do uso de uma fotografia mais maneirista em prol da adoção de uma vertente ancorada numa espécie de realismo, que apesar de crível e pautado em uma concepção naturalista, se desenha também sob o signo de um cinema que também se assume a partir do uso do coeficiente do gênero.
Estamos diante de um trabalho que reverbera bastante o universo do thriller político e do romance entre gerações também. A questão é que Petzold compreende muito claramente os limites e bordas dessas construções. Há uma tensão em primeiro plano que coloca uma família alemã em uma intriga internacional. Mas nem por isso a retratação dos códigos na trama precisa ser conduzida via representação usual.
Antes, vemos essa idéia trabalhada a partir da inserção de elementos e situações bem pontuais e específicas. As identidades falsas, as armas, as fugas, os assaltos a banco, os relacionamentos inteterrompidos. Tudo isso soma para a remodulação desse estado de representatividade sem que a estória tenha de se pasteurizar pelas mãos de uma possível abordagem cliché desses índices temáticos.
É claro que nada disso nos leva a uma pretensa crença de que esse seria o tipo de construção que "salvaria" o cinema em tudo aquilo o que ele tem de mais potente seja no campo da forma ou no sentido. Sou, nesse caso, baziniano e gosto de acreditar, por isso, que talvez o cinema ainda tenha sequer sido inventado ainda. O que certamente existe incondicionalmente é a experiência.
Essa sim é inequívoca e onipresente porque parte do olhar que se partilha via autor e espectador. O equilíbrio dessa nossa vivência com a arte certamente se define muito melhor a partir de alocações como esta. Ela também não é a única. E por isso que entendemos a cinematografia como uma expressão tão plural.
Este filme incrível está disponível no catálogo do Mubi dentro da mostra "Fantasmas entre Nós: O Cinema de Christian Petzold" e eu recomendo muito mesmo.



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