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Chungking Express: os amores feitos no calor do cotidiano

  • Foto do escritor: danielsa510
    danielsa510
  • 12 de jul. de 2021
  • 3 min de leitura

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Direção: Kar-Wai Wong. Roteiro: Kar-Wai Wong. Montagem: William Chang. Direção de Fotografia: Christopher Doyle. Produção: Pui-Wah Chan. Música: Frankie Chan.


Como não nos apaixonamos por esses personagens? Tarefa difícil, principalmente quando consideramos o tato de Kar-wai para a construção de arquétipos dessa conjuntura contemporânea em uma China em plena transformação sócio - cultural. Mas para além dessa abordagem que, dada o êxito e a aura alcançada pelo filme nos últimos 20 anos, há uma análise possível que rompe o cliché da natureza "cult".


Começarmos pela música pode ser um bom ponto de partida. Não é porque a influência da cultura pop nos instiga à empatia junto a esses personagens que temos de ceder a ela. Não é sobre isso. Por que ouvimos tantas e tantas vezes a música do The Mammas and the Papas ou mesmo a versão Taiwanesa da canção dos Cranberries? Porque elas nos dizem coisas importantes sobre essas figuras.


E no caso do enlace entre o policial 663 (Tony Chiu-wai) e Faye (Faye Wong) por exemplo, a percepção acerca da transição por que eles passam, é atravessada por essa faixa sonora e recorrente. Ela não está ali por um mero capricho técnico, mas sim em função de uma prerrogativa conceitual fundamental para a demarcação do desenvolvimento da personalidade desse homem e dessa mulher.


Tanto que, quando ambos estão frente a frente naquilo o que pode ser lido como o derradeiro encontro entre os dois, os lugares já não são os mesmos. Temos Califórnia Dreamin ecoando uma última vez na pequena lanchonete, mas ela ressoa sob a orientação do personagem que antes não sofria qualquer influência da música anteriormente. Um ciclo foi fechado e é para isso que esse componente sonoro está ali.


Quando refletimos sobre a própria ideia do trato com os índices que modulam a experiência do gênero, vários outros pontos de percepção se abrem aqui. Apesar de dividido em dois distintos capítulos ou arcos, Kar-wai não abre mão da costura temática a partir da intersecção entre os universos que unem e separam essas figuras. E quando pensamos nisso não necessariamente precisamos nos limitar à análise territorial em si.


Ou seja, ele faz essa amarração pela via da apresentação da arquetipia em si (os homens da lei, os homens comuns) como também quando considera a atmosfera que circunda aquela localidade (os lugares para comer, os lugares para beber, a vida noturna, os crimes urbanos, e os crimes de amor). Tudo isso diz um pouco dessa estética que claramente se coloca muito a frente de uma simples experiência de colagem intergenérica.


Não se trata somente de um Neo Noir, claramente. Aqui temos lançadas as bases de uma escrita que não soa grafia isolada. Porque seria - como foi - a partir disso que Kar-wai definiu boa parte da concepção estético-tematica do seu trabalho nesse final de década do século XX.


De Cinzas do Tempo (1994) a Amor à Flor da Pele (2000), o diretor definiu claramente uma verdadeira cartografia do romance em distintas narrativas que se ancoraram bastante em aspectos da temporalidade e do topos dessa Taiwan do futuro.


Mais que isso, na verdade. Falando de uma forma de representação que consegue muito bem encontrar um meio termo entre esse cinema mais áspero e ancorado em seus princípios estéticos, mas que agrega toda a potência que as vertentes do gênero e seus tipos têm estabelecido na aventura da cinematografia ao longo dos últimos 100 anos.


Essa obra-prima do cinema está disponível no Mubi dentro da mostra O Cinema Apaixonante de Wong Kar-wai".


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