Dente Canino: um conto sobre as faces do fascismo contemporâneo
- danielsa510

- 22 de mai. de 2023
- 2 min de leitura

O realizador grego, Yorgos Lanthimos (A Favorita, 2018) faz um particular exercício de olhar sobre a natureza do fascismo na contemporaneidade. Chama a atenção a sobriedade com que ele desenha os arquétipos dessa família sem, no entanto, se deter somente ao caráter da crítica social puramente.
Gosto, particularmente, de como ele vai expondo o contexto da narrativa a partir de uma lógica de "palavras - chaves". Não no sentido de compartimentar as informações em cena, mas na ideia de complementaridade entre os eventos em si.
Ainda que tudo vá ocorrendo por meio de uma crescente gradação, vamos notando esses pequenos saltos temporais (no nível da dramaturgia) a nos conduzir dentro do labirinto onde essa família se insere. Sabemos desde o princípio que há algo de disfuncional nesse núcleo familiar.
Mas essa impressão não ocorre via apresentação de pistas autoexpositivas e sim através das próprias interferências do mundo externo no seio daquele agrupamento. Voltando nosso olhar para além das informações que a diegese ou a realidade do filme em si nos dá, vale a atenção ao modo como Lanthimos aplica a preciosa regra desse cinema que parte de uma vertente crítica sem necessariamente ser render a comentários apológicos ou reversamente autoritários.

Porque se a crítica ao pensamento fascista está encarnado na natureza hipercontroladora de um pai ou uma mãe, ele também encontra ecos nessa espécie de contra resposta que essas mesmas figuras sustentam à sociedade capitalista e à mecânica do consumismo desenfreado da pós-modernidade.
Ver o esforço desse patriarca para levar os produtos consumidos em casa sem o rótulo das embalagens é, ao mesmo tempo, uma ilustração desse pensamento doentio e distorcido da realidade para com os filhos, mas também é um posicionamento de certa lucidez no comentário contra um sistema também perverso a seu modo, onde a compra passa a ser o fim único de representação do homem na sociedade.
Na quebra desse sistema ultracomplexo, um filho disposto a ruir tudo de dentro para fora. Um papel cujo fim leva a um caminho de outras possibilidades. Estradas talhadas com dor, ossos e sangue.



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