Great Freedom: os escombros de uma realidade privativa
- danielsa510

- 26 de set. de 2022
- 2 min de leitura

Direção: Sebastian Meise. Roteiro: Sebastian Meise, Thomas Reider. Produção: Oliver Neumann. Montagem: Joana Scrinzi. Fotografia: Crystel Fournier. Som: Atanas Tcholakov, Manuel Meichsner.
O que a liberdade pode significar para aqueles que encontram - se impedidos de expressar suas formas de amar, por exemplo? É partindo desta questão que Sebastian Meise articula todo um pensamento sobre o filme que coloca, em última análise, uma contundente reflexão sobre como podemos olhar para a apresentação da historiografia na superação de determinados conceitos.
Um deles diz respeito ao modo como os eventos de um drama histórico não necessariamente precisam ser retratados pela via do realismo de modo exclusivo. Por isso a forma como as datas são elencadas aqui funcionam tão bem. Não é sobre a marcação de um período no tempo.
E até é. Mas a cronologia aqui não obedece a linha de um "Sonho de Liberdade", a título de comparação. Ela é mais circular, menos dada a um senso de linearidade e esta a favor de uma construção evolutiva desses sujeitos para nos mostrar exatamente essa variação temporal das idas e vindas de Hans pelas celas e corredores das prisões do pós-guerra.
A conexão com a consideração final do filme é direta porque nos coloca para pensar sobre o porquê de as coisas serem como são nesse drama histórico. As interpretações são múltiplas e a magia do cinema emerge dessa mesma multiplicidade de veias de leitura que ele nos permite.
Quando pensamos em filmes como Moonligth (2016) ou Bohemian Rapsody (2018) notamos que a representação da homossexualidade não parece vir desprendida dessa marca contaminante. Como se a orientação sexual desses protagonistas fosse de fato suas maiores maldições. Tudo vai mal a partir disso.
Essa é uma abordagem problemática se considerarmos o valor invertido daquilo o que não pode ser visto como empoderamento, mas uma espécie de dessaturação das potências dessas figuras. Não indo ao encontro disso, Meise prefere investir toda a força que dispõe em termos narrativos na depuração dos seus personagens, sobretudo quando consideramos Hans.
Sua jornada em busca desse amor intangível, quase inalcansável, não se atomiza em um desejo egoico. Notamos que esse é um homem que vai crescendo com as experiências que a sua vida o outorga. Só ele pode se responsabilizar pelo curso dos acontecimentos dessa estória. É interessante como isso também fala do seu papel como anti herói de um mundo em ruínas.
Nos escombros dessa realidade aos cacos, é no amor que esse homem busca, não se completar idealizadamente, mas compartilhar um afeto livre de rótulos, do medo e das sombras da obscuridade. Isto posto, o que seria então tudo aquilo o que ocorre no epílogo? Esqueçamos o desejo da interpretação em si ou da banal e odiosa "explicação".
O que podemos intuir é o entendimento de que, de nada parece adiantar amar se isso tiver de seguir sendo feito a despeito do olhar da superfície do mundo. Isso não parece ainda liberdade. Ser livre é poder fazer escolhas, mesmo que ela seja a deliberada decisão de voltar para o inferno.



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