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Mato Seco em Chamas: o cinema como uma síntese da expressão de um povo

  • Foto do escritor: danielsa510
    danielsa510
  • 6 de mar. de 2023
  • 2 min de leitura

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Direção: Adirey Queirós, Joana Pimenta. Roteiro: Adirey Queirós, Joana Pimenta. Produção: Simone Gonçalves . Montagem: Cristina Amaral. Fotografia: Joana Pimenta. Som: Francisco Craesmeyer.


O que restaria da experiência do cinema (brasileiro) contemporâneo caso destituíssemos todos os seus elementos de (re)presentação dele constitutivos? Talvez essa tenha sido uma questão que esteve com Adirley desde o começo da sua caminhada como realizador.


Autor que sempre foi, pensar o audiovisual como uma síntese de comutação e oposição sempre parece ter sido uma meta para ele. Chegando agora nesse mais recente trabalho, o diretor pensa, em parceria com a realizadora portuguesa, Joana Pimenta, a fabulação do real a partir desse jogo consciente daquilo o que a narrativa cinematográfica contemporânea pode e deve ser.


Numa abordagem bem direta, o que "Mato Seco" nos coloca é o cinema como gesto especulativo, antes mesmo de se assumir em parte uma ficção. Simbiótico, ele encarna uma proposta dessa arte do futuro, não alinhada com a reprodução de um fazer que busca a todo custo tragar o espectador para dentro da tela.


Mas ciente da instância que coloca aquele diante da tela apto para entender o que pode ser a vivência de um filme brasileiro. Nisso, essa ideia de um cinema de etnografia, como o próprio Adirley apresenta sua obra, é determinante para o nosso entendimento como um todo.


Subdividido em grandes blocos temáticos e performáticos, as figuras daquela Ceilândia "entre tempos" acreditam verdadeiramente na concepção daquele universo. Ou seja, para Joana D'arc, Léa e as demais integrantes das Gasolineiras, há petróleo a ser extraído daquele pedaço de solo brasiliense.


E o Brasil da realidade do filme é essa distopia "terceiromundista" onde a religiosidade, a falta de amparo estatal e o conservadorismo de parte da sociedade formam um bolo único no apontamento de uma nação em ebulição.


Lógico que, tanto Adirley quanto Pimenta, entendem os limites desse jogo de representação contido na esfera da dramaturgia. Mas não os impedem de lidar com muita sensibilidade acerca das nuances que a estória coloca em cena.

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Os limites entre o documentário e a ficção novamente testados no cinema iberoamericano

Apesar de a estrutura do filme em si levar essa base "mais longa" enquanto resultado direto de uma montagem mais elástica na sua minutagem entre as sequências, isso se justifica quando pensamos sobre o índice do recorte que a realidade dessa narração evoca.


O tempo aqui, é o da temporalidade da vida "real". Por isso nosso instante no culto da igreja evangélica leva mais tempo, da mesma forma que o forró na noite e as conversas compartilhadas entre esses personagens duram mais. São recortes que, na verdade, nos preparam para o que a obra se revela nos seu terço final de duração.


Não estamos diante de um "filme" na sua acepção clássica. O que é o elemento fílmico nesse sentido? Adirley e Joana nos deixam livres para elaborarmos a questão assim que os créditos finais surgem na tela.


Com a versão de Marquim da Tropa para uma das obras-primas de Morricone enquanto trilha para a sequência final, caímos numa espiral de possibilidades interpretativas sobre o que o filme pode ser para cada um de nós.


Exercício de um cinema iminentemente etnográfico, esse é um cinema que parte e se projeto a partir do imaginário das expressividades de um povo diverso e resiliente como cada um de nós, brasileiros.

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