Matrix Resurrections: da vida e morte do blockbuster contemporâneo
- danielsa510

- 8 de jan. de 2022
- 3 min de leitura

Direção: Lana Wachowski. Roteiro: Lana Wachowski, David Mitchell, Aleksandar Hemon. Montagem: Joseph Jett Sally. Direção de Fotografia: John Toll, Daniele Massaccesi. Direção de Arte: Stephan O. Gessler. Produção: James McTeigue. Som: Dane A. Davis. Música:Tom Tykwer.
Uma questão que parece residir e até superar a própria reflexão do filme em si é a sua concepção. Interessante pensar nisso quando vamos refletir sobre a produção contemporânea em Hollywood porque muitas vezes é nesse campo que os melhores debates acabam surgindo.
Dizer isto é portanto partir do fato de que esta quarta parte da franquia em si iria existir com ou sem as Wachowski na direção. À iminência disso, curioso notar que as realizadoras, e em maior medida, Lana, tenha decidido assumir a autoria da obra.
Diferentemente do impulso que moveu Michael Haneke em 2007 ao refilmar Violência Gratuita, a diretora parece ter partido mesmo de um processo de autodestruição ou pelo menos de um desejo de descanonização do seu próprio projeto lançado 22 anos atrás. No fundo, esse ímpeto soou apenas gratuito mesmo.
E é nesse ponto que as reflexões mais uma vez se ramificam no pensamento sobre os porquês dessa decisão. De um lado, se a Warner Bros. de fato iria realizar o longa independente da posição das diretoras, certamente elas teriam mais referências para restituir ou destruir aquilo o que restaria desse projeto.
Lançado mão da segundo opção, Lana implode mesmo sua "criação". Por isso boa parte de todo o primeiro e segundo atos soam, de certa forma, dentro de uma aura de autenticidade. Ainda que a escolha da farsa do jogo, da ilusão da realidade e de passados escolha futuros alternativos se mesclem para a instituição daquilo o que Ressurections acabou sendo.
Se a decisão funcionou? Não. Porque o que acabamos por perceber é que, esse desejo de destituição do lugar que o filme original estabeleceu e mantém por méritos da própria mente criadora da estória, se esfacela em diferentes momentos nesse longa de 2021. Toda a sequência do armazém (primeira entrada de Neo e equipe na Matrix numa espécie de primeira missão), fala muito disso.
E é algo vexatório. Uma vez que vemos em claro todo esse esquema de uma narrativa que se trai em instantes bem específicos. Ou seja, todo o papo do "filme que precisa ser superado por supostamente estar inserido dentro de uma esquema superestimado", se dilui quando a diretora contraditoriamente busca engendrar uma dinâmica de cena de ação nos moldes da que envolvera a primeira entrada da Nabucodonosor no longa de 1999, por exemplo.
Além de evocar isso mal, o novo Matrix apenas se redunda, vai e volta naquilo o que é referência do passado e naquilo o que ele busca destruir. E nessa ambiguidade de intenções, sobra unicamente um tom de imaturidade mesmo. De uma consciência apartada no tempo, de certa forma. Em um sentido que há até certa potência em determinados tópicos (a ideia dessa pós-Zion, remete muito bem a esse ideal de um futuro em real progressão técnica e conceitual).
Por outro lado, quando a obra abraça esse desejo de - assim como o filme original por ele rechaçado - ir ao encontro a uma ação mais direta, a superficialidade desse processo se escancara ainda mais. Visualizamos a dinâmica da exposição, mas diferentemente do experiência de 1999, ela não opera para nos mostrar o reforço de tudo o que teríamos visto anteriormente por meio da construção dialógica que antecederam esses mesmos eventos.
Quando os créditos finais aparecem na tela, a música que acompanha o instante é também uma espécie de síntese daquilo o que o filme em si foi. Ouvimos um cover da mesma "Wake Up" apresentada no final do longa original. O que nos leva à consciência de que, de fato, o instante de maior virtuosismo deste novo filme se encarcera na abertura dos créditos iniciais com a logo da Warner acompanhada da trilha original de Don Davis.
Entendo que o pensamento pode conduzir a uma leitura conservadora, mas isso é copia em negativo da leitura que Lana nos permite. Haveria outras mais? Definitivamente. A própria diretora apostou nisso. E por comportar essa amplitude na construção esquemática e dialética da interpretação é que o cinema nos move tanto. Mesmo quando estamos diante de filmes tão pouco inspirados (apesar das motivações/aspirações) quanto essa quarta parte de Matrix.



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