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Nosferatu: uma sombra estendida entremundos

  • Foto do escritor: danielsa510
    danielsa510
  • 23 de jan.
  • 3 min de leitura

Crédito: Universal Pictures
Crédito: Universal Pictures

Direção: Robert Eggers. Roteiro: Robert Eggers, Bram Stoker, Henrik Galeen. Montagem: Louise Ford. Direção de Fotografia: Jarin Blaschke. Produção: Jeff Robinov, John Graham, David Minkowski. Som: Steve Little. Efeitos Especiais: Martin Prýca. Música: Robin Carolan. Design de Produção: Craig Lathrop.


Cerimônia. A solenidade parece ser algo que Robert Eggers fez bastante questão de preservar para determinar uma atmosfera soturna e mórbida presente em todo o filme. Não que uma atitude eminentemente solene seja o tom utilizado pelos personagens todo o tempo, mas ela abarca uma parte considerável do trabalho.


Interessante como o filme não leva consigo uma perspectiva aterrorizante, no sentido de que alguma desgraça ou algum evento mais gráfico vá acontecer sem que estejamos esperando. Os instantes do susto previsto ou sugerido estão ali, mas eles não seguem uma cartilha do gatilho.


Penso que Longlegs (2024) talvez seja um dos exemplos onde isso se manifesta da pior forma possível. De novo, não é nem que o Eggers não o faça, mas há um maior comedimento nos termos de aplicação da gramática desse horror que seria mais mecanizado, enlatado de todo modo.


Muito tem se falado a respeito do caráter plástico do filme e do modo como as imagens emulam ou endossam esse aspecto puramente cosmético em relação à plástica das suas imagens, mas fico raciocinando sobre o quanto isso é um desdobramento das próprias tentativas adotadas pelo próprio diretor de endossar uma impressão antinaturalista desta narrativa.


Essa é uma decisão que até supõe esse vazio maneirista, mas que, na minha leitura, não se resume a isso. No exercício comparado com a Bruxa (2016), por exemplo, também notamos esse aspecto forte dessa imagem azulada e de um cinza que a tudo parece contaminar, mas que quando voltamos ao filme recente, a toada parece se referir muito mais a um desejo de uma aproximação com o caráter, digamos, menos realista da coisa em determinados momentos.


Penso que todos os instantes em que a sombra do monstro assume esse primeiro plano na tela, o ilusionismo impera por uma questão referencial mesmo. Muitas pessoas têm levantado a discussão sobre o estar comparativo entre Murnau, Herzog e Eggers, mas não penso que isso seja algo a considerar.


São realizadores distintos, de épocas diferentes e lidando com questões igualmente particulares, cada um a sua forma. Eggers não é nenhum dos dois diretores alemães, óbvio, mas a distinção desses dados nos ajudam a fazer uma análise menos arbitrária ou mesmo apaixonante quando lidamos com essas contingências inter-fílmicas.


O filme é o que é, e aquilo o que ele deveria ter sido ou deixado de ser não cabe no julgo analítico ou crítico que seja. Logo, talvez mais interessante caiba pensarmos a respeito daquilo que essa releitura traz em relação ao modo como poderemos lê-la no futuro. Que filme será esse? Ou quais questões ele deve movimentar a partir da sua construção?


Realmente, gosto muito da reflexão sobre as vertentes que animam, por exemplo, o debate em torno do trabalho do F. Murnau como esse cinema que referenciava o Pós Primeira Guerra e anunciava os presságios do conflito seguinte.


Do mesmo modo que a obra do Herzog trazia para o seu centro a pesquisa que o diretor fazia, naquele período, sobre a forma como a natureza opera no mundo enquanto uma força a qual o homem não consegue conter ou modular na sua dinâmica com ela.


Uma via de análise possível à adaptação de Eggers pode se dar nesse aspecto intercambiável entre um naturalismo presente na caracterização da realidade do mundo tal qual ele é retratado no filme e o próprio modo como o antagonista/protagonista é representado, parte humano, parte monstro, metade algo deste mundo e numa outra metade traçado pela sobrenaturalidade.


Na fissura heterotópica, Orlok reside e estende sua sombra entremundos.

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