O Melhor Amigo: da despretensão e seus jogos de intenções
- danielsa510
- 13 de mar.
- 3 min de leitura

Direção: Allan Deberton. Roteiro: Raul Damasceno, Pedro Karam, Allan Deberton, Otavio Chamorro, Andre Araujo. Montagem: Germano de Oliveira, Victor Costa Lopes. Direção de Fotografia: Beto Martins. Produção: Marcelo Pinheiro, Allan Deberton, Ariadne Mazzetti, Patrícia Baía, César Teixeira. Direção de Arte: Marcin Malisz. Maquiagem: Elen Barbosa.
Há cerca de pouco mais de uma década, o cinema brasileiro contemporâneo lidava com algumas incisivas mudanças na sua forma de ser no mundo. Uma das mais contundentes, apesar de sua aparente despretensão, era a inserção dos rótulos de garrafas de cerveja nas cenas dos filmes, por exemplo.
Se em meados das décadas de 1990 e início dos anos 2000 nossa produção cinematográfica nacional esforçava-se para esconder tais códigos indiciais dessa propaganda semiautorizada, hoje, não são mais os nomes das bebidas que figuram em primeiro plano nas obras, mas sim o próprio patrocinador/produtor da peça audiovisual. E tudo bem.
Esse preâmbulo, feito com base no pensamento de César Migliorin em 2011, nos coloca diante de uma série de outras questões que perpassam distintas produções em diferentes partes de um país diverso como o Brasil. No Ceará, o momento certamente nos induz a um pensamento sobre os fluxos e os ditames daquilo que vai para a tela nesse recorte.
Num período de relativa calmaria do jogo político e de uma positiva lógica dos mesmos incentivos destinados à criação dos filmes, é nessa conjuntura que uma obra como a de Allan Deberton se insere. Não que seja nada demais. Não o é e nem parece querer ser. O que, por si, já soa justo, em alguma escala.
Medida de deferimento em um padrão regulado por uma espécie de vibração de autocontrole e pouca densidade estético-conceitual das obras, o momento parece ressoar uma decisão de parte da cinematografia do estado em função de uma lógica do filme por ele mesmo.
Ora, se entre 2005 e 2025 tanta coisa parece ter mudado no modo como os filmes ressoam no mundo para nós, talvez seja em função de alguma projeção mais racional na necessidade de os realizadores de se conectar mais diretamente e de modo seguro com o espectador, baseada na menor quantidade de riscos possíveis, a partir de narrativas pouco desafiantes, confortáveis.
Óbvio que o último ponto pouco tem a ver com qualquer falta de perícia por parte do realizador. Lembrar de Eric Rohmer é falar em boa parte disso haja visto a carga de perícia e complexidade pela qual o cinema de um autor como esse é conhecida e marcada.
No caso das produções feitas no Ceará nos últimos cinco anos, salvo algumas raras exceções - Greice (2024) e Tiramisu (2024) -, o que notamos é uma desmedida falta de referência nesse sentido. Voltando a Deberton, todo o escopo do filme nos levaria a uma conexão com o cinema de um diretor como Guillaume Brac (All Hands On Deck, 2020) ou mesmo Jaqcues Demy (Os Guarda-Chuva do Amor, 1964) mas, novamente, falta referencial e mesmo o mínimo de diálogo com algo fora dos limites subsidiados pela Globo ou Telecine.
Esse é um lugar muito aquém daquilo o que o cinema cearense pode estar. Por um outro lado, vai ver essa seja a rota decidida pelos próprios realizadores deste tempo. E nos, as testemunhas disso. Uma vez isto posto, não há nada a ser feito até que um novo ciclo produtivo consiga reorientar a rota de alguma forma. Torçamos.
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