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Oppenheimer: quando o cinema ressignifica seus excessos

  • Foto do escritor: danielsa510
    danielsa510
  • 31 de jul. de 2023
  • 3 min de leitura

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Direção: Christopher Nolan. Roteiro: Christopher Nolan. Produção: Emma Thomas, Christopher Nolan. Montagem: Jennifer Lame. Fotografia: Hoyte van Hoytema. Música: Ludwig Göransson. Som: Dan O'Connell


Curioso pensarmos que Christopher Nolan pode ter se despojado dos excessos no seu estilo em um filme tão denso e volumoso como este. Claro que dentro da ideia de se construir um épico biográfico, o diretor manteve os traços da sua assinatura para fazer um projeto de ação ao fim das contas.


Não no sentido daquilo o que a cartilha dos gêneros aponta, mas muito numa perspectiva de um trabalho que, para além das cifras nele envolto, revela essa espécie de salto no nosso entendimento do modo como o realizador lida com seus próprios vícios e virtudes durante a execução cinematográfica.


É de fato, sua obra mais dinâmica, até aqui. De modo que esse senso de emergência do que deve ser feito, no nível da realidade da narrativa, acaba contaminando sua estrutura generalizadamente. E isso é algo que vai desde a necessidade de Robert em ter de concluir a tarefa a que ele mesmo impôs a si, até o ininterrupto fluxo de eventos em desdobramento ao longo dos 180 minutos de duração do longa-metragem.


Diferentemente da grande maioria dos seus filmes anteriores, aqui a prioridade é o descarte de tudo o que for excesso. São falas curtas, diretas e intercaladas numa linha espaço-temporal indissociável. Na comparação com "Dunkirk" (2017), por exemplo, não temos essas lacunas naquilo o que fica interdito no próprio processo da ação. Em "Tenet"(2020), a ação em si acaba se truncando com os intervalos de contextualização da trama.


Aqui, Nolan encontra esse meio-termo de fruição entre esses modos de fazer. Não há eliminação de um em detrimento do outro e sim sua junção. São duas perspectivas paralelas. Há a "fissão", para todas as sequências em cores relacionadas à trajetória focadas em Oppenheimer (Cillian Murphy) e há a "fusão", àquelas relacionadas à Lewis Strauss (Robert D. jr).


Uma decisão feliz quando pensamos nessa união entre o que é tema, modo de organização estrutural fílmico e de condução rítmica da obra na sua totalidade. Mesmo quando pensamos o cinema mundial mainstream contemporâneo enquanto essa experiência de exageros na busca pelo espetáculo sonoro imagético, o filme também propõe essa quebra, quase epistemológica desses termos.


Tudo nos nela para o arco envolvendo o teste de Trinity. é, de fato, o segmento que melhor representa essa mudança no modo como Nolan revisionou suas próprias decisões quanto ao elemento "espetáculo" na cinematografia. Retornemos à "Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge" (2012). No trato com o subgênero de super-heróis, o elemento da bomba encarna uma concepção bem conservadora e pouco original da mecânica da "contagem regressiva".


A relação do protagonista com o artefato em tudo nos orienta para uma relação de esgotamento da tensão muito em função da previsibilidade do que é posto em cena. Neste drama histórico, a contagem opera reversamente, nos jogando a cada novo terço do cronômetro para dentro e perto do evento-fim. Quando ele finalmente ocorre, e o teste é executado, não há a consolidação do esperado. O fenômeno ocorre, claramente, mas dentro de uma ideação de reversibilidade.


Os planos refletem o poder da captura de uma imagem daquilo o que seria a representação pictórica da exposição da face humana à potência luminosa de mil sóis. O silêncio dessa conjuntura nos lembra uma vez mais por que estamos frente a uma biografia épica: diante da tela, alcançamos uma proximidade ainda mais contundente do protagonista e seus parceiros de trabalho.


Ao invés do estrondo de uma explosão de milhares de megatons, a respiração de um homem só ecoando em 360º no silêncio de uma sala de projeção, no silêncio de uma sala de estar ou na quietude silenciosa de um notebook que reproduz o mesmo filme via fones de ouvido. O espetáculo é a reação minimalista humana.


Essa é, talvez, a grande virada perceptiva de Nolan para com sua própria forma de operar suas obras. Sinal de maturidade cinematográfica numa execução espetacular reversa, minimamente maximizada e amplificadamente reduzida.



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