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Querência: a hibridização comedida do documentário de ficcção

  • Foto do escritor: danielsa510
    danielsa510
  • 30 de mai. de 2022
  • 2 min de leitura

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Divulgação: Vitrine Filmes

Direção: Helvécio Marins Jr. Roteiro: Helvécio Marins Jr. Montagem: Telmo Churro. Direção de Fotografia: Arauco Hernández Holz. Direção de Arte: Denise Vieira. Produção: Walter Salles. Música: O Grivo.


A querência é o local onde o animal foi criado ou onde se acostumou a pastar e para o qual volta, por instinto, se dali for afastado. A definição do dicionário para o termo exemplifica muito precisamente a natureza dos animais do contexto rural brasileiro.


Quando nos utilizamos da metáfora para dar conta do estar humano, uma série de outras variáveis entram em cena. Uma delas seria a noção do telurismo do homem contemporâneo. Essa figura aqui é muito bem representada na figuras desses cidadãos do interior de Minas Gerais.


Juntos, Marcelo di Souza, Kaic Lima, Carlos Dalmir e sua esposa, Márcia Rosa, são a base desse drama de Helvécio Martins. Interessante como ele aposta na hibridização sem fetichizar a abordagem. Percebemos muito isso no modo como o filme se pensa a partir dos seus componentes estéticos e visuais, por exemplo.


Essa natureza campestre não é pintada a partir de um esforço ultra estilizado. Pelo contrário, notamos o cuidado com que alguns muitos planos são dispostos, mas todos eles levam na sua gênese essa premissa simplista e minimalista, até.


Muitas vezes a impressão que temos é a de que a câmera foi posta diante do ambiente e pronto. Claro que isso não significa dizer que Helvécio e seu fotógrafo, Arauco Holz, construíram essa dinâmica arbitrariamente. Há muito em evidência do exercício de escolha sobre para onde se apontar as lentes dessa câmera.


E o fato de o filme não soar "arrogante", em um sentido que acolher imagens unicamente plastificadas e cosmetizadas já garantem a autenticidade e segurança que os idealizadores do projeto tinham diante do trabalho a ser feito.


Seja no Brasil ou em outros países do mundo essa é uma decisão fulcral no fazer cinematográfico. Ela não soa impositiva, por não nos obrigar a olhar para as imagens pelo filtro de uma captação embelezada ao extremo. Nem artificializada, por acreditar no espaço que a natureza oferece como moldura aberta para a representação na realidade do filme.


Falar do realismo é importante porque é o reforço acertado na construção de um cinema possível. Mais que isso, é a prática da cinematografia a partir, não de um índice de apropriação predatória - na ótica do gesto colonizador do realizador que predatoriamente se apropria das narrativas pessoais e reais dos seus retratados e nada em troca oferece.


Aqui o processo de Helvécio parece verdadeiramente ir no fluxo oposto. Quando a câmera está ligada a captar dia-a-dia desses cidadãos, suas vidas não estão sendo furtadas. O cinema aqui partilha uma possibilidade de reimaginação dessas vivências.


Tenho reiteradamente retornado a esse ponto quando refletimos sobre nossa cinematografia contemporânea porque esse estado tende a se cristalizar numa dezena de excelentes filmes por nós feitos. E a despeito de qualquer outra coisa, essa é uma das nossas maiores potências nesse campo artiristico.

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