Superman: Onde o cinema opera por meio do imaginário
- danielsa510

- 6 de abr. de 2019
- 4 min de leitura

Direção: Richard Donner. Roteiro: Mario Puzo, David Newman, Leslie Newman, e Robert Benton. Montagem: Stuart Baird, Michael Ellis. Direção de Fotografia: Geoffrey Unsworth. Design de Produção: John Barry. Efeitos Visuais: Les Bowie. Música: John Williams.
Há quatro décadas, o cinema de super-heróis iniciava um importante momento de retomada. Para o público da década de 1970 e das gerações que viriam a seguir, esse foi também um período marcado pelo estabelecimento de novos paradigmas neste subgênero. Dos trabalhos que surgiram dentro deste contexto, Superman (1978) continua sendo um dos mais emblemáticos. Mas de onde vem a força desse filme? E quais legados ele deixa passado esse tempo?
Dirigido por Richard Donner e roteirizado por Mario Puzo, David Newman, Leslie Newman, e Robert Benton, o longa narra a história de Ka-El (Christopher Reeve), um órfão alienígena que é enviado à Terra, onde se torna o primeiro e maior super-herói da sua casa adotiva. O filme é a primeira produção que adaptou as História em Quadrinhos (HQs) do personagem da DC Comics criado por Jerry Siegel e Joe Shuster.
Talvez uma das maiores questões que envolvam qualquer análise desta obra em específico seja nossa relação afetiva com ela. Geralmente, crescemos lendo e assistindo as narrativas desse personagem. A figura dele em nosso imaginário é muito forte. Aos quatro anos de idade, o garoto coloca uma capa vermelha nas costas e a imagem tende a prescindir de legenda. O “S” no peito, significado de “esperança” no planeta Kripton, se tornou um símbolo poderoso dentro da cultura pop.
Munido de parte desses referenciais, o primeiro filme sobre esse homem extraordinário foi feito. Criado dentro da já poderosa máquina de Hollywood, o longa foi orçado em $55 Milhões e aliou uma abordagem “épica” a um tom mais genérico das aventuras que tinham como base as HQs da DC Comics. É interessante como ele, nesse caso, se divide bem entre seus tons que encontra no épico uma forma para retratar a mitologia em volta do protagonista. E todo o primeiro ato é construído em torno dessa proposta.
A figura imponente da população de Kripton, suas estruturas grandiosas, tudo isso é valorizado a partir do que o design de produção do longa propõe. Seu prólogo é apresentado a partir dessa ordem. Os diálogos em torno da iminente destruição do planeta são simples e despojados de complexidade, mas ao mesmo tempo ganham um peso dramático em função, principalmente, da performance de Marlon Brando, ao interpretar Jor-El, pai do herói. É nesse ponto que chegamos ao primeiro ato, certamente o melhor de toda a obra.
Vemos Ka-El tornar-se Clark Kent, que curiosamente é o alter ego de Superman. Tudo isso é tecido sequencialmente a partir de blocos de cenas que contextualizam muito objetivamente quem esse homem é. Ele corre em velocidade inimaginável entre os campos de sua cidade e executa atividades rotineiras com destreza invejáveis. Ele é super. Mas entende que seu lugar não é no sul. Decide ir paro o norte. Reencontra a fortaleza onde jaz sua família e se assume como o herói que a Terra precisa a partir do final do primeiro ato.
Dali em diante, Superman está entre nós. Interessante notar como a partir desse ponto ou mais especificamente do segundo ato do filme em diante, há uma visível irregularidade nos seus tons e intenções. Os limites entre a obra de classificação indicativa livre e uma com restrições se mesclam, não necessariamente dialogando, obviamente, o que gera um estranhamento curioso.
Lois pergunta, em determinado momento, se o herói conseguiria ver sua lingerie através da sua roupa. São passagens desnecessárias que destoam bastante de outros subtextos abordados pelo longa, como por exemplo, a moral do protagonista e o desafio que ele tem consigo mesmo diante da inevitabilidade da morte. Aqui, Donner justifica e exemplifica muito exatamente a representação da mitologia de um personagem tão clássico (nas HQs). O parêntese vem do fato de Superman ser o primeiro trabalho a trazer essa complexidade para as telas.
Olhando à luz dos 40 anos que chegam, em 2019 o clímax do filme é bastante duro mas igualmente memorável. Afinal, aqui temos a reposta do por que essa figura é tão impressionante? Porque ele, em um momento de total desespero pode ser o único ser capaz de alterar o próprio movimento de rotação da Terra para salvar a vida de alguém a quem ele ama. E nisso, temos um dos mais memoráveis momentos da cinematografia moderna, sem exageros.
Por essas e tantas outras inúmeras razões é que Superman se tornou icônico. Claro, não se trata de uma esvaziada e gasta abordagem que colocam o filme em uma espécie de panteão dos grandes, quando não o melhor filme de super-heróis já feito. Batman - O Cavaleiro das Trevas (2008) é esse filme. Mas a relação desse trabalho, que inaugura as narrativas do Homem de Aço no cinema, junto ao nosso imaginário é muito forte.
Meu primeiro contato com ele foi aos 4 anos. Chego aos 30 e o filme ainda está comigo. Assim como certamente estará com meus filhos e com os seus também. Mas de onde vem essa conexão? É do cinema em si mesmo. Não, porque muito filmes do subgênero na contemporaneidade são péssimos exemplos da apropriação equivocada desse estilo de produção - vide Esquadrão Suicida (2016).
Enquanto algumas obras ilustram, portanto, uma espécie de desgaste do subgênero, trabalhos como Superman evocam mais um encanto que se baseia na nossa relação afetiva com ela. De fato, ver Reeve no uniforme empolga, assim como vê-lo interpretando o personagem, inspira. Sabemos que ainda não voamos, temos visão raio x ou super força, mas podemos ter uma ponta do senso de moral, justiça e bom senso que o herói leva consigo. Podemos ser isso se quisermos e esse é sem dúvidas o maior legado que esse herói e esse filme deixa conosco.



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