Terra Selvagem: a releitura sóbria do cinema de gênero contemporâneo
- danielsa510

- 18 de out. de 2021
- 2 min de leitura

Direção: Taylor Sheridan. Roteiro: Taylor Sheridan. Montagem: Gary D. Roach. Direção de Fotografia: Ben Richardson. Produção: Bob Weinstein, Harvey Weinstein. Direção de Arte: Lauren Slatten. Música:Nick Cave, Warren Ellis.
A convergência do exercício da forma e do sentido parece ser um dos maiores desafios e diferenciais no exercício do cinema contemporâneo. O que Taylor Sheridan consegue fazer aqui é exatamente esse movimento. Ele nem se rende a um sopro estritamente estetizante, calcado na forma e numa estilização esvaziada das imagens por ele pensadas, nem megalomaniza a narrativa que propõe.
Dentro dessa veia de uma cinematografia que relê o gênero, é muito boa a proposta diretiva de conduzir os personagens a partir de recortes bem definidos, mas não estereotipados. Há o cowboy, a personagem iniciante, a vítima que detona o núcleo da trama e os vilões, ameaças veladas para onde todo o filme converge e se potencializa também.
Apesar de definir cada uma dessas figuras, é exemplar a execução do desenho desses tipos. Mais do que buscar defini - los pela ação - índice definitivo para a delimitação desses seres em cena - o texto de Sheridan encontra muitas vezes na descrição dos seus valores e visões sobre o mundo as assinaturas pelas quais os compreendemos de qual lado da estória eles estão.
"Não se pega um lobo indo onde ele possa estar mas sim aonde ele esteve", afirma o patrulheiro Cory (Jeremy Renner) numa demonstração clara de como essa veia textual pode bem definir o escopo daquilo o que aquele homem é e como ele pensa. O que mostra na teoria porque ele seria tão imbatível e infalível enquanto protagonista.
Essas são escolhas de traço personalistico que definem e justificam o peso que o personagem tem para a estória. Do lado desse homem, nos sentimos seguros. Confiamos nele, ainda que também entendamos que em essência ele é um herói fraturado. O filme trabalha muito bem essa dimensão trágica e dialética das situações em que os personagens estão envolvidos.
Eles não são traçados por uma linha idealizada exclusivamente. Há um peso que contamina a narrativa do macro (a violência institucionalizada pela lei junto aos povos indígenas daquela parte dos Estados Unidos), para o micro, as perdas que as famílias daquele local partilham em função desse mesmo estado de exceção determinado naquele território.
Interessante como o realizador traz muito da sua experiência em Sicário (2015) e Hell or High Water (2016) para experimentar um modelo de construção situacional em cena que supera em muito essa mesma perspectiva limitadora e determinista dos personagens nas suas relações interpessoais.
Por exemplo, Jane (Elizabeth Olsen) não vai à casa de Cory, em determinado momento do filme por estar atraída por ele. Mas sim pra tentar entender o que motivava o personagem a ajudá-la no caso. Sentimos que há essa tensão romântica entre os dois, mas isso nunca se coloca como algo latente. Esse não é o laço que ancora essas duas pessoas. E isso é ótimo.
Essa é uma cinematografia que aponta para uma perspectiva outra dentro da dinâmica que percebemos Hollywood hoje. Ao invés de uma construção espetacularizada unicamente numa ação direta (tiros e combates), a modulação desses tópicos com um projeto quase anticlimático. Quase, porque a sua conclusão suspende essa dinâmica até o seu suspiro final. Excelente.



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