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O Homem dos Sonhos: ou uma luz que jamais se apaga


Crédito: California Filmes

Direção: Kristoffer Borgli. Roteiro: Kristoffer Borgli. Montagem: Kristoffer Borgli, Zach Wiegmann. Direção de Fotografia: Benjamin Loeb. Produção: Ari Aster, Nicolas Cage. Som: Sylvain Bellemare. Direção de Arte: John O'Regan, Trevor Smale. Música: Owen Pallett.


Se tem algo que Kristoffer Borgli entende conscientemente na relação com seus filmes é o fato de não poupar seus personagens. Em verdade, colocar essas figuras à prova é quase um princípio metodológico aplicado pelo realizador na execução de suas obras.


Aqui, ele apresenta um protagonista que, a princípio, não evoca nem tanto uma identificação mas igualmente nenhuma repulsa direta com o espectador, na comparação com a figura de Signe, principal personagem do seu trabalho anterior.


Há uma intenção de operar nos limites da humanização desse homem comum contemporâneo e sua ingenuidade na lida com o mundo enquanto ele se dá hoje. Se tudo pode ser uma ferramenta de hegemonia do mercado e da dinâmica capitalista, Paul Matthews se enquadra nesse escopo de alguém desgraçado por esse meio.


Claro que o ar farsesco da obra sempre nos conduz a uma interpretação menos óbvia de tudo o que acontece na narrativa, mas a crítica ao sistema se pontua como esse contraponto ao modo com que as grandes empresas desumanizam as relações com as pessoas em função das receitas possíveis a cada novo acordo fechado.


Professor universitário, nosso herói só queria publicar um livro sobre biologia evolucionista. Ele consegue um contrato para isso em função do fenômeno dos sonhos - repentinamente todas as pessoas da sua comunidade passam a sonhar com Paul em diferentes contextos - mas não era por isso que o acadêmico queria ser lembrado.


Ao mesmo tempo, pouco mesmo ele faz para consolidar os planos da vida para além dos compromissos na universidade. A ruína da vida contemporânea, portanto, parece ser tão somente fruto do próprio modo com que essas figuras do universo proposto por Borgli lidam com os eventos presentes nas suas vidas.


A grande diferença entre a atmosfera desse filme e seu antecessor, "Doente de Mim Mesma" (2022), é a objetividade com que o diretor opta por desenvolver os eventos da trama.


Não decidir criar uma estrutura de ficção de personagens viciados ou alucinados diante da experiência de estar vivo é uma prova do amadurecimento do artista ante a abordagem que ele propõe para o seu trabalho.


Na comparação com "Beau Tem Medo" (2023), por exemplo, não notamos o cinismo sádico e reincidente com que Aster imagina os tipos de seu último filme. Ficamos com Paul até o fim para entendermos o quanto ele consegue se ressignificar, não de um modo piegas, mas maduro mesmo.


Como um alguém que entende a importância de seguir adiante na vida, ainda que está não tenha ganhado o contorno daquilo o que ele projetara um período atrás. Coisa que Signe também faz e que, por essa razão, reforça essa visão mais lúcida com que Borgli olha para sua obra.


Há uma luz que nunca se apaga diante dessas figuras, perceber os os momentos em que eles se acolhem nessa luminância é mais forte ponto de ação do seu cinema. Algo que o cinismo de um horror como o de Ari Aster, infelizmente, não consegue referenciar. Falta tato para isso.

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