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Pobres Criaturas: a morte, um recomeço


Crédito: Searchlight Pictures

Direção: Yorgos Lanthimos. Roteiro: Tony McNamara. Montagem: Yorgos Mavropsaridis. Direção de Fotografia: Robbie Ryan. Produção: David Minkowski, Emma Stone. Som: Johnnie Burn. Música: Jerskin Fendrix. Design de Produção: James Price, Shona Heath.


Interessante como nesse mais recente ponto da sua linha discursiva, Yorgos Lanthimos opera costurando pelo menos três diferentes eixos balizadores da narrativa do filme. Uma vez que ele pode ser lido como um trabalho histórico por pontuar personagens e noções de um passado que estaria ali entre algum lugar do final do século XIX e início do XX.


Assim como é um projeto que pauta o protagonismo feminino fora de uma perspectiva apologizante. Afinal, Bella é uma mulher contemporaneizada dentro dessa cronologia em descompasso com aquilo o que ela o é. Do mesmo modo como é um título que joga com sua própria concepção de gênero.


Ou seja, a partir daquilo o que podemos entender por um drama histórico, um filme de horror, uma comédia de costumes ou mesmo um drama erótico. É tudo isso na verdade. É um filme de concepção, poderíamos colocar assim. Datado de uma consciência que se revela por meio de sutilezas.


Por isso que o design de produção aqui é tão central. Já que ele nos dá as pistas dessa possível interpretação ao mesmo passo em que cria uma sensação de estranhamento pela aparente artificialidade presente nos recursos nele evocados.


É como se tivéssemos a noção de que os espaços fílmicos se instituem numa ideia de lugares historicamente naturalistas, como o interior da casa de Godwin ou nas áreas externas das cidades, ao mesmo tempo em que esses elementos espaciais e cenográficos estivessem ali visivelmente instituídos enquanto matérias oníricas ou mesmo falsificantes desses lugares, sejam eles de estadia ou e passagem.


E se o cinema é o único eixo indutor da sua própria realidade, as cidades artificialmente falando também ressoam essa perspectiva desvinculada de algum traço do real. Quando vemos Bella explorando as vielas de Lisboa, por exemplo, não são as ruas da cidade portuguesa que vemos, de fato.


Mas sim, aquela encaixada dentro da realidade do filme, considerando seu tom fantástico e antinaturalista. A própria ideia da protagonista como um universo atomizado daquela era Vitoriana reflete bem esse desejo de Lanthimos de apresentar essa figura como um recipiente de concentração de toda a experiência de um mundo em um organismo só.


Sua fome por experienciar o mundo talvez nem tanto derive do fato de ela possuir a memória de um alguém que a procedeu. Mas certamente preceda desse conceito de ela ser o centro de um universo em (imagi)nação. E à medida que suas vivências a revelam um mundo quase sem limites, ela, na verdade, alcança as bordas da sua existência quando entende seu papel dentro disso tudo.


Ela não deve respostas a ninguém, assim como não leva o rancor pela dureza dos eventos que a conduziu aos confins do mundo bem como da sua própria memória. Ao fim, tudo meio que se resolve. E diferentemente da projeção duvidosa que o final em aberto sempre nos deixa, aqui, não parece nos haver espaço para brechas soltas.


Claro que a indefinição dos sentidos presentes no filme está longe de ser um problema - uma das suas mais estimulantes distinções em relação às outras formas de arte reside nisso. Mas, de fato, a trajetória de Bella tem um fim, um começo, e um recomeço a partir daquilo o que a personagem acha justo no seu lugar que ela ocupa no mundo.

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